Cladine Alves, 35 anos, lavradora e moradora do Bairro América, em Aracaju, estava com dor de ouvido há alguns dias. Delsides dos Santos, 56 anos, pedreiro que mora no Bairro Veneza, também em Aracaju, apresentava um sangramento repentino no nariz. Já Hugo José, de 20 anos, auxiliar de solda, proveniente do Eduardo Gomes, município de São Cristóvão, sentia dores no corpo e ânsia de vômito.
Apesar dos sintomas que essas três pessoas apresentavam serem considerados de baixa complexidade, ou de atendimento ambulatorial, eles procuraram o Hospital de Urgências de Sergipe (HUSE), referência para casos de média e alta complexidade. Essa procura tem sido constante nos últimos três meses devido à greve dos médicos do município de Aracaju, que restringe o acolhimento nos postos de saúde e na Unidades de Pronto Atendimento (UPA), além da recusa do Hospital Cirurgia em receber novos pacientes.
“Cerca de 70% dos nossos pacientes são de baixa e média complexidade. Casos que deveriam ser resolvidos nas unidades dos bairros, sem maiores complicações, mas que acabam aqui, que é única porta que a população encontra disponível”, informa o coordenador do Pronto Socorro (PS) do HUSE, o enfermeiro Vinícius Vilela.
Somente no mês de fevereiro, foram atendidos no HUSE 479 pacientes com dor abdominal, 309 com dor de cabeça e 187 de ouvido, 58 com vômito, 40 alérgicos, 15 com cansaço e três com unha encravada. “A população não parou de adoecer, mas está sem opção de assistência médica. Recorrem ao HUSE o que prejudica, desgasta e desvia o foco da unidade, que é atender média e alta complexidade”, enfatiza.
Destes pacientes 68% são de Aracaju. Somente na segunda-feira, 13, dos 128 usuários do SUS que deram entrada no Pronto Socorro do Hospital, 126 eram da Capital. “É uma taxa muito elevada. A capacidade da Área Azul está em 183,64% neste momento, quase o dobro do que poderíamos acolher”, preocupa-se o coordenador do PS.
Transferência
Além disso, há o problema dos pacientes que dão entrada na unidade, têm o diagnóstico fechado e ficam com algum procedimento pendente. “Não temos porta para transferir esse usuário. Hoje, 20 aguardam uma neurocirurgia, 25 cirurgias ortopédicas e 12 vasculares. Todas deveriam ser realizadas no Hospital de Cirurgia (HC), mas o atendimento lá também não tem ocorrido”, complementa Vinícius Vilela.
A taxa de ocupação de toda a unidade está elevada: 175% na Área Vermelha, 188% na Verde Trauma, 161% na Azul, destinada à baixa complexidade. Apenas a Verde Clínica mantém a média, com 103% de ocupação. A consequência desta superlotação é sentida por profissionais e usuários do SUS. “O recurso humano fica sobrecarregado, estressado e insatisfeito pela falta de condições de trabalho, o que acaba refletindo na assistência direta ao paciente. Todo mundo sai perdendo”, lamenta.
A expectativa para o aliviar a demanda do HUSE, segundo Vinícius Vilela, é o término imediato da greve dos médicos do município de Aracaju e o fim do impasse entre a Prefeitura da Capital e o Hospital de Cirurgia. “Não há outra solução. Somos reféns do sistema e a população procura a única unidade disponível. Mas nem espaço físico nós temos mais para acolher esse paciente”.
A superintendente da unidade, Lycia Diniz, diz que a cada dia o Hospital está mais travado, sem condições de assistência. “Esta noite o Cirurgia parou novamente. Isso inviabiliza qualquer solução a curto prazo. Outras unidades da Rede têm dado suporte, como as unidades regionais e alguns filantrópicos, mas nenhuma possui a estrutura e o perfil do HC. Ele precisa voltar a funcionar plenamente para que a atendimento à população volte ao estágio normal”, declara.
Por Luiza Sampaio/SES