Ao elevar os níveis de produtividade, a adoção da inteligência artificial pelo setor privado poderia acrescentar até US$ 429 bilhões em ganhos para a economia brasileira nos próximos treze anos. O cenário, no entanto, dependeria de um processo de requalificação e treinamento de mão de obra.
A projeção é da consultoria Accenture, que analisou o impacto da IA nas cinco maiores economias da América Latina (Argentina, Brasil, Chile, Colômbia e México). A estimativa é de um incremento total de até US$ 1 trilhão no Produto Interno Bruto (PIB) da região, na projeção mais otimista do estudo.
Para projetar o efeito no PIB, o relatório considerou três cenários distintos de adoção da IA generativa e simulou como mudanças na composição da força de trabalho impactariam o crescimento econômico até 2038. As projeções consideram tanto o potencial de automatização das tarefas quanto a migração entre ocupações.
Na análise, a Accenture considerou mais de 19 mil tarefas ligadas a cerca de 900 famílias de ocupações em 19 setores da economia. A base metodológica se ancorou em dados estatísticos do mercado dos Estados Unidos, que foram adaptados para a América Latina.
O cenário com mais ganhos leva em consideração uma adoção da IA pelo setor privado acompanhada de estratégias estruturadas de reorganização do trabalho e de capacitação de profissionais, com implementação gradual da tecnologia em um ciclo de 10 anos. Esse quadro foi chamado de “centrado em pessoas”.
O estudo também simulou dois outros cenários. No chamado “agressivo”, em que a adoção da tecnologia ocorre rapidamente, em apenas cinco anos, mas sem foco em qualificação de mão de obra, o impacto econômico seria menor, com ganhos estimados para a América Latina de cerca de US$ 200 bilhões.
Já a projeção “cautelosa” prevê uma adoção mais lenta da IA, ao longo de 15 anos, com menor reorganização do trabalho e ganhos mais modestos no PIB. Em todos os casos, o Brasil aparece como a economia com maior potencial absoluto de crescimento.
11º lugar em investimento privado em IA
O estudo indica que, no cenário agressivo, com alta adoção tecnológica e pouca preocupação com a qualificação, os ganhos se concentram nos primeiros anos e vêm acompanhados de aumento no desemprego. Já no modelo centrado nas pessoas, os impactos se diluem ao longo de uma década e vêm acompanhados de baixo deslocamento de força de trabalho.
Neste caso, a ampliação da produtividade não se dá apenas por corte de custos, mas por uma reorganização do trabalho que permite maior foco em atividades estratégicas. Daniel Lázaro, líder de Dados e IA da Accenture na América Latina, responsável pelo estudo, ressalta que os maiores ganhos projetados no estudo só poderão ser alcançados se o Brasil investir de forma consistente em capacitação.
— A lógica é também de que não adianta muito você comprar os melhores tijolos se você não sabe como fazer um prédio ou uma ponte. A distância entre ter a capacidade de fazer e gerar algum resultado está em preparar as pessoas e estruturar processos — afirma.
Para Daniel Lázaro, líder de Dados e IA da Accenture na América Latina, o Brasil caminha para um cenário “agressivo” de adoção da inteligência artificial, com empresas investindo pesado em tecnologias, mas sem clareza sobre como aplicá-las de forma estratégica.
O estudo mostra que os países da América Latina estão em uma posição intermediária globalmente quando se trata de implementação, investimento e inovação em IA. A região responde por apenas 3% dos gastos globais do setor privado com IA.
O Brasil, no entanto, destaca-se como o 11º lugar no mundo que mais registrou aporte privado na tecnologia em 2024, cerca de US$ 1,1 bilhão, uma posição puxada principalmente pela indústria financeira. A liderança, na lista, é dos Estados Unidos, com US$ 50,5 bilhões de capital.
Setor financeiro é o mais exposto
A estimativa é de que o Brasil poderia alcançar ganhos de produtividade entre 11% e 17% ao longo dos próximos treze anos com adoção da IA, taxas próximas da média latino-americana. Os índices contrastam com os incrementos de produtividade registrados no país na última década, em que ficou praticamente estagnado nesse indicador.
O relatório também calcula o grau de diferentes setores do país à automação. Na média, a projeção é que até 39% das horas de trabalho do país estejam suscetíveis a algum nível de impacto pela inteligência artificial até 2038, com um parcela que envolveria automação (22%) e outra otimização de processos (17%).
Para a consultoria, os setores com maior potencial de ganhos de produtividade são justamente os que já lidam com grande volume de dados e tarefas digitais. Segundo a Accenture, áreas como seguros, software, plataformas digitais, mídia e bancos estão entre as mais expostas à transformação. Já setores intensivos em trabalho físico, como mineração e construção civil, tendem a ter impactos menores no curto prazo.
Nos mercados de capitais, por exemplo, 46% das horas trabalhadas poderiam ter alguma melhoria com aplicação da IA, enquanto 27% teriam potencial de automação. Na indústria de bens de consumo, esse percentual cai para 11% e 14%, respectivamente.
Fonte: Folha de Pernambuco