Desesperadas e sem ter para onde ir, famílias ocuparam o prédio da prefeitura
Os defensores públicos dos Núcleos de Direitos Humanos e Bairros da Defensoria Pública do Estado, Sérgio Barreto Morais, Herick Argollo e Alfredo Nikolaus prestaram assistência às 40 famílias que foram retiradas do Conjunto Habitacional João Alves de Araújo, em Malhador, por força de uma ação de reintegração de posse movida pelo município.
Durante a ação, os defensores públicos esgotaram todas as negociações junto aos representantes da Prefeitura de Malhador para que as pessoas fossem retiradas com a garantia de assistência por parte do Município seja um local digno ou aluguel social para as famílias.
“Por insistência por parte da Defensoria Pública e para garantir o mínimo de segurança alimentar, a Prefeitura liberou apenas almoço para as crianças, mas para onde essas pessoas irão se não têm para onde ir? Durante reunião com o procurador e demais representantes do Município foram esgotadas todas as possibilidades de acordo para concessão de aluguel social sob a alegação de que a Prefeitura não teria condições de abarcar as famílias, ou seja, pagar em torno de R$ 8 mil por mês para que as pessoas tenham um local digno. Infelizmente, sem ter para onde ir e desesperados sem assistência do poder público, a única alternativa para eles foi ocupar o prédio da Prefeitura. Foi marcada uma reunião para esta terça-feira, 31, mas a prefeita disse que não viria mais porque as pessoas ocuparam o prédio. O município teve tempo suficiente para prestar assistência a essas famílias e porque deixou chegar a esse ponto?”, contesta indignado o coordenador do Núcleo de Direitos Humanos, Sérgio Barreto Morais.
Durante a retirada das pessoas, a assistente social da Prefeitura de Malhador, Márcia Nascimento, garantiu que todas as famílias foram cadastradas e que foi feito levantamento real daqueles que não têm para onde ir com o objetivo de viabilizar assistência. “Algumas já foram cadastradas e outras têm para onde ir, mas as demais que estão desassistidas entramos em contato com a coordenação para que seja feito um levantamento do número real. Os pertences deles foram levados para a quadra de uma escola, mas infelizmente quanto ao aluguel social a prefeitura não tem como arcar em virtude da dificuldade e, praticamente inviável, uma vez que o município é pequeno”, disse.
O procurador do Município, Alexandro Dias, reafirmou que a prefeitura não tem condições de pagar aluguel social e que toda assistência foi dada às famílias. “O município vem dando assistência desde quando foi notificado extrajudicialmente da reintegração, contudo, passa por uma série de dificuldades financeiras, porém, alocar 40 famílias não há nenhuma condição. Em nenhum momento a prefeitura se furtou de sua responsabilidade, contudo temos poucos recursos para implementar políticas públicas dessa magnitude e nessa velocidade. Fomos tomados de surpresa, assim como a Defensoria Pública e outros órgãos, mas conseguimos mobilizar uma força tarefa para atender as famílias no ato da reintegração”, alegou.
A tenente do Grupo de Gestão de Crise e Conflitos da Polícia Militar (CGCC), Beliza França, disse que a reintegração foi sucesso em parte e destacou a presença da Defensoria e demais órgãos. “Não é somente o resultado que interessa para nós, mas o meio, o processo. Existimos para garantir o cumprimento pacífico, mas precisamos manter a relação positiva com os movimentos sociais e comunidades com as quais trabalhamos. Existe por parte da PM o interesse social de que haja cumprimento, mas com a atenção às famílias, uma vez que não estamos lidando com infratores da lei, mas com famílias em situação de risco e extrema vulnerabilidade social. Iniciamos o cumprimento através de tratativas de negociação, o que estamos tendo êxito em cerca de 60% a 70% das reintegrações com saídas voluntárias por ano. Tivemos impasse na sexta-feira, 27, porque a Defensoria e demais órgãos não estavam presentes, uma vez que não foram comunicados e que são importantes para a atuação da polícia”, destacou.
“O Manual Nacional de Diretrizes para Cumprimento de Mandados Judiciais de Manutenção e Reintegração de Posse Coletiva referendado pelo Conselho Nacional de Justiça prevê que para pautar a legalidade em reintegrações de posse rural e urbana devemos adotar os princípios da dignidade da pessoa humana, entre outros, preconizando as medidas de tratativa de negociação prévia e que o poder judiciário competente intime, notifique e ou oficie os órgãos necessários para o cumprimento, o que não ocorreu. Quando fazemos visita técnica verificamos se há crianças, idosos, portadores de deficiência e pessoas em situação de vulnerabilidade social para fazermos um chamamento. Quando são notificados para a reunião de planejamento, uma vez que o judiciário se opôs, possibilitou uma série de problemas em virtude da Defensoria e outros órgãos não terem sido notificados por parte do judiciário, e a reintegração acabou acontecendo no último dia 27, desassistida de logística necessária”, apontou.
Sérgio Barreto Morais reafirma que os ocupantes estão situação de extrema vulnerabilidade e que a Prefeitura de Malhador tem a obrigação legal de prestar assistência às famílias. “A Prefeitura não pode se furtar do seu papel constitucional de assistir, nos mais variados setores, a essas famílias. O que rege essas relações conflituosas é a manutenção plena da dignidade humana de pessoas que estão historicamente afastadas de políticas públicas. Estamos estudando a possibilidade concreta de movermos uma ação contra o município para tutelar os interesses dessas famílias e esperamos que o judiciário tenha a sensibilidade para compreender a dramaticidade da situação dessas pessoas”, pontuou.
A Ação Civil Pública (ACP) já está sendo estudada pelos defensores públicos do Núcleo de Direitos Humanos, Sérgio Barreto Morais; Eric Martins, Herick Argollo e o defensor público do Núcleo de Bairros, Alfredo Nikolaus.
Por Débora Matos