
Espaço sempre foi conhecido por seus eventos juninos e acima de tudo a oportunidade de crescimento dada à população sergipana
Há 32 anos, no dia 10 de maio de 1985, o Centro de Criatividade abria suas portas para o povo sergipano. Durante todo esse tempo foi palco de grandes eventos culturais, oficinas de arte-educação, festejos juninos e fomento da arte e da cultura do estado. As diversas oficinas e eventos realizados no espaço oportunizaram diversos aprendizados às pessoas, como o servidor público, Rosivaldo Alves, conhecido como Vadico, tornasse fomentador cultural e artista plástico.
Vadico nasceu na Maloca, comunidade de remanescentes quilombolas situada ao fundo do centro, reconhecida como o primeiro quilombo urbano de Sergipe. Ele conta que, ainda criança, participava das quadrilhas, oficinas de música, artes e dos festejos juninos e culturais ofertados no espaço. Essa relação o levou a se tornar funcionário, além de aprender o ofício da xilogravura, papel machê e batik.
“Minha infância foi nesse Centro de Criatividade participando dos eventos e das oficinas. Por conta dessa relação consegui uma colocação como office boy e estou há 14 anos trabalhando como funcionário. Atualmente, atuo no setor administrativo e promovo eventos ligados ao samba da comunidade Maloca”, conta Vadico.
Ele conta que, além do acesso à arte e à cultura, o Centro de Criatividade levou emprego e geração de renda para as comunidades do seu entorno, formada pelos bairros Getúlio Vargas, Cirurgia e Suíssa. “Mas não somente os moradores desses bairros se beneficiaram do espaço; todo Aracaju veio beber da fonte das oficinas, palestras, seminários e eventos promovidos pelo centro”, destacou.
Vadico lembra que o Centro de Criatividade foi palco dos festejos juninos; manifestações folclóricas; colônia de férias; academia da cidade, com exercícios para idosos; Festival Novo Canto; Virada Cultural; Novembro Negro; Autos de Natal, com a árvore ecológica com mais de 12 metros; campeonatos de futsal; além de outros eventos.
“Eram vários projetos que a comunidade foi inserida e que se revelaram vários artistas, professores, fomentadores culturais. Enfim, profissionais da arte e da cultura que tiveram sua formação participando dos projetos do centro. É preciso reacender a chama e a retomada da participação da comunidade no centro”, afirmou.
Para ele, essa retomada tem que ser com a participação da comunidade. “Os moradores dos bairros que estão no entorno do centro têm que ser ouvidos para saber o que eles necessitam e agregar à política cultural da área. Ouvindo a comunidade cresce o elo entre a população e o governo”, acentuou.
Arranca Unha
Um dos grandes eventos é o Arraiá Arranca Unha, que vai ser retomado a partir do dia 22 de junho, um dia após a inauguração da primeira etapa da reforma do centro pelo governador Jackson Barreto. O ato está marcado para o dia 21 de junho. A programação dos festejos juninos no Centro de Criatividade vai de 22 a 30 de junho.
O arraial foi concebido pelo morador da comunidade, senhor João da Cruz, na década de 1940. O centro incorporou o festejo em sua programação em 1986, um ano após a sua inauguração, numa demonstração de inter-relação com a comunidade em que está situado. Junto com o arraial, também vieram os concursos de quadrilhas e de sanfoneiros que fizeram um grande sucesso e que também serão retomadas neste novo momento.
Reforma
De acordo com o diretor do Centro de Criatividade, Isaac Galvão, após 32 anos de inaugurado, esta é a primeira reforma estruturante que o local recebe. “São cerca de R$ 3,9 milhões investidos neste espaço que foi palco de grandes eventos da cultura e da arte popular sergipana”, afirma.
Idealizado pela professora Aglaé Fontes, a pedido do então governador João Alves Filho, o centro foi pensado para ser uma espécie de escola de capacitação de professores no campo da arte educação, uma vez que a Universidade Federal Sergipe (UFS) não oferecia esse tipo de formação. A sua estrutura foi planejada por Jaime Lerner, arquiteto que já foi prefeito de Curitiba.
“Ao longo desses 32 anos foram realizados cursos, oficinas, seminários, palestras, mesas redondas sobre arte e cultura popular, enfim uma gama de eventos. O centro sempre foi um grande espaço de fomento cultural do estado. Daqui saíram vários artistas filhos da comunidade como o Vadico, Edmar Santos, Betinho Caixa D’Água e outros”, acentuou Isaac.
Em paralelo, o Centro de Criatividade também abriu suas portas para os eventos culturais e da arte popular do estado, como os festejos juninos, apresentação de grupos folclóricos, festivais de música e exibição de filmes. “Ele tem o papel de agregador e fomentador da cultura popular do estado. É um espaço que tem grande importância para a cultura e que agora está sendo totalmente reformado pelo governo. A área está sendo repensada pelos que fazem a cultura do estado para ser um agregador da realidade da cultura sergipana, nordestina e brasileira”, reforçou.
Isaac defende que seja feito intercâmbio com a UFS e outras faculdades e universidades, para discutir mecanismos de capacitação permanente dos que fazem a arte e a cultura, bem como daqueles que repassam os seus conhecimentos para os alunos. “A relação com a comunidade também deve ser uma constante e fator preponderante. Temos de pensar como o centro vai se comportar nessa nova era nesse novo século, mas ouvindo sempre a comunidade, para saber o que ela espera desse espaço cultural”, acentuou.
Comemoração
Quem está comemorando a reforma do Centro de Criatividade é a comunidade e os artistas. O sanfoneiro Antônio Carlos de Oliveira, conhecido como Boca Louca, de 78 anos, disse que foi o campeão dos concursos de quadrilha do centro e está ansioso para que o espaço seja reinaugurado e volte a funcionar. “Sempre participei dos eventos aqui. Fui campeão nos concursos de sanfoneiro e de quadrilhas. Esse espaço chamou a atenção para a cultura popular, ele não foi apenas um local de cursos e oficinais. Aqui a cultura era viva”, ressalta.
Com 59 anos animando os festejos juninos tocando a sua sanfona, Boca Louca disse que além da cultura, o centro promove emprego e renda para a comunidade. “Nos eventos, a comunidade se organiza e vem vender as comidas típicas da região. Os turistas também prestigiam e isso é um dinheiro que entra e ajuda na renda familiar”, disse.
Outro morador que está animado é o ex-quadrilheiro André do Vale. Ele disse que começou a dança no Arraiá Arranca Unha, na quadrilha Pioneiro da Roça. “Esse arraial é um dos mais tradicionais do estado e tem mais de 70 anos. Ao incorporar esse arraial, o centro ampliou e passou a ser um espaço de festejos juninos. A comunidade começou a se organizar e a participar dos eventos. Dessa maneira, além de ter acesso à cultura e à arte, os moradores dos bairros também se mobilizavam e conseguiam ampliar a sua renda ao venderem produtos nos dias dos eventos, a exemplo das comidas típicas”, relatou.
Há 40 anos com um estabelecimento comercial em frente ao Centro de Criatividade, Antônio dos Santos, proprietário do bar da Bisteca, disse que viu seu negócio prosperar após a chegada do espaço. “O Centro melhorou o meu negócio, trazendo novos clientes, artistas, pessoas de outros bairros e outros estados. Antes essa área era abandonada, depois da construção ficou bonita, iluminada e bem frequentada. Essa reforma vai retomar os tempos áureos do espaço cultural”, comemora Antônio.
Moradora da Maloca, a funcionária pública aposentada, Idalina da Conceição Santos, 70 anos, conhecida por Dona Doca, disse que nasceu na comunidade e pode afirmar que, depois da chegada do Centro de Criatividade, o bairro melhorou e os jovens puderam usufruir de um espaço de arte e educação. “Aqui antes era um areal, depois um ‘cemitério de anjinhos’, em seguida uma caixa d’água. Por alguns anos a área ficou desativada até o governo construir o centro e com isso dar oportunidade aos jovens estudarem arte, música, dança, além da realização dos festejos juninos”, relata.
Dona Doca recorda da Ópera do Milho, um dos espetáculos mais bonitos que já viu na vida encenado no Centro de Criatividade. “Este espetáculo ficou na história. Quem viu, viu; quem não viu, não verá mais”, relata, ao dizer que o espaço construído “levantou” o bairro.
“O Centro de Criatividade é o retrato vivo do São João e da arte popular em Aracaju. Daqui saíram vários artistas como o ‘Papudo do Balança Eu’, que é meu sobrinho. A revitalização do centro vai revigorar a nossa comunidade”, concluiu.
Fonte: ASN